30 de julho: dia mundial de enfrentamento ao tráfico de pessoas
Desde a instituição da data para refletir o tráfico de pessoas, houve avanços e retrocessos em defesa da vida por CLÁUDIA PEREIRA (pela Comissão Episcopal Pastoral Especial para o Enfrentamento ao Tráfico Humano da CNBB) Os noticiários brasileiros relatam, com regularidade nos últimos anos, denúncias de tráfico de pessoas. No sábado, 30 de julho, comemora-se o dia mundial de enfrentamento ao tráfico humano, data instituída em 2013 pela Assembleia Geral da Nações Unidas. O Relatório das Nações Unidas divulgado em 2021, revelou que mais de 50 mil pessoas foram identificadas como vítimas de tráfico humano. No Brasil, com a pandemia de COVID-19 e o aumento das vulnerabilidades, o tráfico de pessoas aumentou consideravelmente. O relatório aponta que mulheres e meninas são as maiores vítimas para a exploração sexual; e homens os mais procurados para o trabalho escravo. Segundo o Protocolo de Palermo, é considerado como tráfico de pessoas recrutar, transportar, alojar, transferir ou acolher alguém, recorrendo a ameaças ou uso da força ou outras formas de coação, abusos e situações de vulnerabilidade com entrega de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração. Portanto, ainda que haja consentimento por parte da vítima, estes atos são classificados como crime. No Brasil, existe a Lei Federal nº 13.344/2016, que além de definir o tráfico de pessoas garante a reinserção das vítimas na sociedade. O relatório nacional sobre tráfico de pessoas, produzido e divulgado em 2021 pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) em parceria com a Secretária Nacional de Justiça do Ministério da Justiça e Segurança Pública (SENAJUS/MJSP), identificou duas modalidades mais exploradas no Brasil: trabalho análogo à escravidão; seguido da exploração sexual. Existem quatro classificações para as modalidades do tráfico de pessoas em todo mundo: Tráfico para fins de exploração sexual; laboral ou trabalho análogo a escravidão; tráfico de migrantes; e tráfico de órgãos. No Brasil, outras modalidades foram reconhecidas pelo Ministério da Justiça, entre elas a servidão doméstica, mendicância e o casamento servil. Desde a criação da Comissão Episcopal Pastoral Especial para o Enfrentamento ao Tráfico Humano, da CNBB, em 2016, a Igreja tem avançado nas articulações de combate e prevenção em todo do País. Dom Evaristo Spengler, Presidente da Comissão, diz que a Igreja se organizou para enfrentar as amarras da escravidão a nível nacional e se desloca pelas regiões do Brasil, bem como tem multiplicado e sensibilizando a sociedade sobre o tráfico humano. A comissão reúne questões fundamentais sobre a prevenção, proteção e denúncias em torno da temática com capacitações realizadas durante todo o ano no País. Em 2014, o tráfico humano foi tema da campanha da fraternidade e o resultado da reflexão fortaleceu ações dentro da Igreja em conjunto com a sociedade civil. Representantes da comissão, organizações, órgãos públicos, núcleos de defesa e pesquisadores expõem o reflexo do enfrentamento nos últimos anos, sobretudo ao contexto da pandemia e a crise econômica social no País. Os entrevistados apontam os avanços e retrocessos nas políticas públicas, dados subnotificados do crime, regiões com maiores dificuldades de enfrentamento ao tráfico de pessoas. O TRÁFICO HUMANO NA GRANDE METRÓPOLE Irmã Eurides Alves de Oliveira, religiosa da Congregação das Irmãs do Imaculado Coração de Maria, integra a Comissão Episcopal Pastoral Especial para o Enfrentamento ao Tráfico Humano da CNBB e coordenou em âmbito nacional a rede Um Grito Pela Vida. Atuando na cidade de São Paulo, Irmã Eurides fala da realidade do enfrentamento em grandes cidades e as articulações não efetivas junto ao poder público. “A ausência de dados é a maior dificuldade. Existem registros de denúncias, mas são subnotificadas. Temos os dados nacionais, mas são muito pulverizados, cada órgão têm suas estatísticas que são importantes, mas que não dão conta da dimensão desta realidade. Em São Paulo, enfrentamos a situação do trabalho análogo a escravidão que envolve os migrantes, que são explorados no mercado informal, oficina de costura, indústrias e outros setores. Temos o tráfico para o trabalho infantil e a exploração sexual. A fome e a miséria na vida das pessoas que vivem nas áreas urbanas da região sudeste as deixam suscetíveis a este crime. Em nosso atual cenário, o tráfico acontece até pela anuência da pessoa, mesmo sabendo que não é o certo, mas acaba sendo a alternativa na vida como meio de sobrevivência. A região sudeste por concentrar o maior número das metrópoles, é onde se tem a maior dificuldade de mensurar a quantidade e o enfrentamento ao tráfico de pessoas”, disse a Irmã. A religiosa conta que até o ano de 2016, São Paulo tinha um núcleo de enfrentamento bastante combatível, mas há mais de dois anos esse núcleo está inativo. “Nós quanto comissão e sociedade civil temos o dever em chamar atenção do estado para a urgência em reativar os espaços e os mecanismos de enfrentamento. Talvez um dos grandes problemas seja o fato de que em nosso País as políticas públicas não sejam de estado e sim de governo, não há prioridade e isso desestrutura os mecanismos. O desafio neste momento é a sociedade ficar atenta às propostas de políticas de governo quanto à pauta do tráfico humano. Estamos em período eleitoral, temos que ficar atentos a quais candidatos pautam este tema em suas plataformas de governo e após as eleições batalhar para que o Congresso referende o enfrentamento como política de Estado”. Foto: Pixabay ALICIAMENTOS DURANTE A PANDEMIA Silvia Cristina Xavier, coordenadora do Núcleo de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas da Secretaria Estadual da Justiça e Trabalho do estado do Paraná, coordena junto a equipe um trabalho de prevenção que estreita as relações com os órgãos e instituições do estado, que por estar na tríplice fronteira é potencial rota para o tráfico de pessoas. “Durante a pandemia, não paramos de fazer atendimento e os serviços de prevenção. Nesse período, tivemos relatos, mas não tivemos a denúncia formalizada. São casos que em razão do isolamento a vítima estava com proximidade do aliciador e não se sentiu segura. Isto colabora para a subnotificação…
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