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Dia: 18 de junho de 2024

Dom Adilson Busin: “A xenofobia é o ápice da irracionalidade”

Foto: Cláudia Pereira    De 17 a 23 de junho de 2024, a Comissão Episcopal Especial para o Enfrentamento ao Tráfico Humano (CEPEETH) da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), está realizando uma missão no Estado de Roraima, na fronteira com a Guiana e a Venezuela. Uma comissão que segundo seu presidente, dom Adilson Pedro Busin, bispo da diocese de Tubarão (SC), tem entre seus objetivos “a conscientização, a incidência política e eclesial”. Tráfico de pessoas, uma realidade escondida A missão ajuda a “trazer a temática do tráfico humano, que ele é escondido, inclusive as vítimas são escondidas”, ressalta o bispo. Estamos diante de um problema social mundial, que o Papa Francisco tanto insiste. A incidência deve ser dupla, segundo dom Busin, “ad intra da própria Igreja, para nós tomarmos consciência desse problema grave, dessa chaga da humanidade, como diz o Papa Francisco, e da sociedade”. Diante da realidade de Roraima, com uma ebulição migratória e tantas “fronteiras porosas”, a visita da comissão quer com que “essa temática do tráfico humano seja exibido, visibilizado, seja sentido, que chegue ao coração, à mente das pessoas, no mundo da política e na sociedade, com políticas públicas que venham a enfrentar o tráfico de pessoas”, destaca o presidente da comissão. Fronteira Brasil-Guiana: vulnerabilidades comuns Na fronteira entre o Brasil e a Guiana, o fluxo de venezuelanos, cubanos e haitianos é constante. Os migrantes chegam muitas vezes em situação de extrema pobreza, sendo muito grande a demora para conseguir documentação, que é tramitada em Boa Vista, com uma lista de espera de mais de cem migrantes em Bonfim, que pelo fato de não ter documentação são vítimas fáceis das redes de exploração. Tanto em Bonfim (Brasil), como em Lethem (Guiana), uma região com predominância de indígenas Wapichana, os povos originários não se submetem às fronteiras dos brancos, a Igreja católica dá assistência aos migrantes, sempre de portas abertas para dividir o pouco que eles têm. Na região de fronteira, as vulnerabilidades são comuns, uma delas é o tráfico de mercúrio, usado no garimpo ilegal, com vínculos estreitos com fações do crime organizado, que produz graves doenças e diversas explorações na população local e nos migrantes, e que nos leva a refletir sobre o tema da 39ª Semana do Migrante, “Migração e Casa Comum”. Para superar as diversas vulnerabilidades, a CEPEETH, fiel a Jesus de Nazaré, que quer vida em abundância para todos e todas, apresentou materiais que sistematizam o trabalho da Igreja do Brasil no enfrentamento ao tráfico de pessoas, que é crime e tem que ser denunciado, somando com diversas instâncias eclesiais, em vista de incidir nas mudanças estruturais que levem o poder público a assumir sua função, a criar políticas públicas, que muitas vezes surgem a partir da mobilização. São histórias de sofrimento, relatadas por aqueles que lhes acolhem e acompanham, que também são vivenciadas pelos migrantes que passam nesta fronteira, abandona pelo poder público. Diante disso, uma das demandas é a presença da Polícia Federal na fronteira, uma dificuldade diante da falta de pessoal no Estado, mais uma expressão do Estado mínimo, que quer ser instaurado em tantos países, segundo insistiu o bispo de Roraima, dom Evaristo Spengler. Se faz necessário estreitar laços transfronteiriços, juntar forças, buscar propostas concretas, gerar processos conjuntos, uma dinâmica que pode contar com a colaboração da comissão. Ao mesmo tempo não é fácil enfrentar alguns problemas comuns, dada a legislação diferente em cada país, o que demanda maior mobilização popular que crie consciência e possibilite mudanças. Foto: Cláudia Pereira    Ir ao encontro dos invissíveis Olhando para dentro da Igreja, dom Adilson Busin insiste em “tomarmos consciência desse problema que faz parte da Igreja que vai ao encontro dos últimos e desses invisíveis, vítimas do tráfico humano”. Para a Igreja do Brasil, na perspectiva do enfrentamento ao tráfico humano, teve grande importância a Campanha da Fraternidade de 2014, “Fraternidade e Tráfico Humano”, um grande marco na conscientização das comunidades, paróquias e dioceses, que amadureceu a criação do grupo de trabalho que depois deu passo à comissão, a quem muitas vezes, dentro da Igreja, é delegado o enfrentamento dessa realidade. O bispo de Tubarão insiste em “não deixar esquecer, porque as vítimas são esquecidas”, mesmo sabendo que “o tráfico é presente, está na nossa sociedade em suas diversas modalidades”, citando o tráfico de órgãos, a exploração sexual de crianças e adolescentes, o trabalho análogo à escravidão. O bispo faz um chamado a nos conscientizarmos da Doutrina Social da Igreja, ver as vítimas do tráfico humano como “uma das tantas categorias que são vulneráveis, e ao mesmo tempo, uma das categorias mais invisíveis, porque ele é tão sutil, e é difícil de alcançar por causa de toda a problemática que envolve o tráfico de pessoas”. A tentação de culpar o estrangeiro Refletindo sobre a Campanha da Fraternidade 2024, “Fraternidade e Amizade Social”, que tem como lema “Vós sois todos irmãos e irmãs”, dom Adilson Busin afirma que “uma das tentações do mundo atual, não só no Brasil, é a polarização que nós vemos, as guerras, a violência, uma sociedade irada, onde nós nos sentimos acuados”. Lembrando que no decorrer da história encontramos os bodes expiatórios, o bispo ressalta que “neste momento em muitos países, e nós temos tentação também no Brasil, de culpar a quem é estrangeiro, quem vem de fora”. Nessa perspectiva, o presidente da comissão denuncia que “a xenofobia é o ápice da irracionalidade”, fazendo um chamado a olhar a Campanha da Fraternidade de 2024 e o convite do Papa Francisco ao cuidado da casa comum, que o leva a dizer que “não tem ninguém de fora, as fronteiras estão ali, como limites políticos, geográficos, mas é uma contradição do Evangelho olhar o irmão como um problema”. Nessa perspectiva, o bispo sublinha que “os problemas estão aí para que nós como Igreja, como sociedade, como governos e como Nações Unidas, tratemos os migrantes não com esse olhar infeliz de achá-los culpáveis, como causa dos problemas”. Frente a isso, afirma que “eles estão aí porque…
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Abertura da 39 ª Semana do Migrante em Roraima: “A migração é uma riqueza, que torna a sociedade mais plural, mais acolhedora”

A diocese de Roraima realizou nesta segunda-feira a abertura da 39ª Semana do Migrante, que em 2024 tem como tema “Migração e Casa Comum”, e como lema “Alarga o espaço da tua tenda” (Is 54,2). A migração é uma situação que marca a vida do Estado de Roraima nos últimos anos, até o ponto que atualmente 30 por cento da população de Roraima é formada por migrantes venezuelanos. Anualmente entram mais ou menos 200 mil venezuelanos por ano pela fronteira de Pacaraima. O bispo de Roraima, dom Evaristo Spengler lembrou que a população de Roraima é uma população migrante, chegada de diferentes estados do Brasil. A partir de 2017, a migração foi de venezuelanos, e “a Igreja foi a primeira que começou a dar uma resposta a essa situação, não vamos dizer problema, porque é a acolhida de irmãos”. A Igreja local, com a ajuda da Igreja do Brasil, foi dando passos, sobretudo com a Caritas, e hoje são muitas as estruturas da Igreja de Roraima, em parceria com outras instituições, que acolhem os migrantes. Dom Evaristo lembrou que cada dia a Igreja católica contribui pelo menos com 1.500 cafés da manhã e 1.500 almoços, fora do serviço de documentação, de acolhimento, com o projeto Sumauma. Segundo o bispo de Roraima, “todos os que chegaram aqui trouxeram a sua cultura, o seu jeito de ser, a sua história, e cada um trouxe um pouquinho mais de enriquecimento a nossa sociedade, a visão do mundo, a culinária”, algo que foi compartilhado durante a abertura da Semana do Migrante, realizada do lado da Rodoviária de Boa Vista. Ele insiste em que “a migração não é um problema, a migração é uma riqueza, que torna a sociedade mais plural, mais acolhedora, uma sociedade de fato aberta a todas as pessoas que possam aqui chegar”. Com relação ao cuidado da casa comum, tema da 39ª Semana do Migrante, o bispo de Roraima lembrou que “a mudança climática atingiu fortemente o nosso estado”, lembrando o longo período de seca de agosto de 2023 a março de 2024, o que demanda “maior cuidado com essa casa comum e com o planeta que Deus nos deu”, recordando que o clima da Amazônia afeta o Brasil inteiro, América Latina e o mundo. É por isso que “é necessário olhar com cuidado para essa questão do meio ambiente, olhar para recompor aquilo que de fato foi essa terra, hoje cada vez mais enfraquecida com as queimadas”. O bispo de Tubarão e presidente da Comissão Especial de Enfrentamento ao Tráfico Humano da CNBB, dom Adilson Pedro Busin, presente na abertura da Semana do Migrante, fez um convite a “alargar a tenda do nosso coração para acolher, para proteger, para cuidar”. O bispo lembrou a presença de 4.000 venezuelanos em sua diocese, afirmando que “nossa terra é onde nós vivemos, é onde nós encontramos pessoas para partilhar a família humana, onde somos acolhidos e ganhamos o pão”, pedindo que “o nosso coração, a nossa família, a nossa comunidade, a nossa Igreja e a sociedade possa sempre estender as estacas como sinal de acolhida, porque todos nós somos família de Deus”.   Roraima é um Estado marcado por uma realidade grave e diversificada, como é a questão yanomami, um território indígena onde o garimpo ilegal tomou conta, com quase 80 pistas de pouso clandestinas, controladas pelo narco garimpo. As fronteiras com os outros países, sobretudo Venezuela e Guiana, muitos vulneráveis, sendo fácil entrar e sair do país. O tráfico de pessoas é algo sobre o que se está começando a falar entre os povos indígenas, segundo Davi Kopenawa, que afirma ser algo antigo entre os brancos. Nessa perspectiva, o líder yanomami destaca que “é bom que vocês acordaram para falar com nós”. Ele denuncia a exploração das mulheres yanomami pelos garimpeiros, insistindo em que cada vez são mais as indígenas grávidas de garimpeiros. Os migrantes em Roraima são vítimas do tráfico humano, que se concretiza de diversos modos, no trabalho escravo, a servidão doméstica, o aluguel de crianças para mendicância, para as pessoas serem atendidas em primeiro lugar nas filas, a exploração sexual de crianças e adolescentes, inclusive o roubo de crianças do colo das mães. Pode ser falado abertamente de falta de respeito aos direitos das pessoas, muitas vezes com a conivência do poder público e da própria sociedade. Uma realidade que também se dá nos abrigos de acolhida, superlotados, com poucas pessoas para realizar o atendimento e cuidado, que em muitos casos tem se tornado territórios sem lei, tendo acontecido assassinatos dentro desses abrigos. De fato, muitos migrantes não querem entrar nos abrigos, preferem dormir na rua, até o ponto de que Boa Vista é a cidade com maior porcentual de população de rua do Brasil. Nessa realidade, a Igreja católica, a única instituição livre de fato para denunciar a violação dos direitos humanos, tem alargado sua tenda para acolher aqueles que chegaram no Brasil depois de enfrentar grandes e graves dificuldades. Com relação ao Projeto Sumauma, sediado na paróquia da Consolata de Boa Vista, seu pároco, padre Revislander dos Santos Araújo, destaca que esse trabalho, esse milagre da partilha, iniciou com a chegada dos primeiros venezuelanos em Boa Vista. A paróquia da Consolata é a mais próxima à rodoviária da cidade e lá os migrantes iam à procura de ajuda. O padre insiste em que “todo mundo tem o direito de ir para onde quiser”, ressaltando que “com nossa pobreza, a gente tenta dar todos os dias o melhor que temos para que eles se sintam bem entre nós”. Uma partilha que ajudou a combater a xenofobia e acolher o outro, destacou. No enfrentamento ao tráfico de pessoas, uma realidade muito ligada à migração, se faz necessário juntar forças para que as autoridades possam efetivar essa política, algo que não está acontecendo no Estado de Roraima, para descobrir luz para fortalecer nossa caminhada, segundo Socorro Santos, diretora do Programa de Direitos Humanos e Cidadania, da Assembleia Legislativa de Roraima. Ela reflete sobre a realidade do tráfico humano, que é…
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