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Dia: 26 de abril de 2025

Carta e ordenação diaconal marca Jubileu dos Povos Indígenas de Roraima

A diocese de Roraima realizou nos dias 25 e 26 de abril de 2025 na Missão Surumú, Raposa Serra do Sol, o Jubileu dos Povos Indígenas, que foi encerrado com a ordenação diaconal de Djavan André da Silva, indígena do povo Macuxi. No final do encontro, precedido por uma peregrinação, onde participou grande número de indígenas e contou com a presença da Presidente da Funai, Joenia Wapichana e de dom Gonzalo Ontiveros, bispo do Vicariato de Caroní (Venezuela), foi dada a conhecer a Carta do Jubileu da Aliança com os Povos Indígenas. Transbordar de esperança Um texto que iniciou recordando as palavras de dom Aldo Mongiano, bispo da diocese já falecido: “É um privilégio ter os povos indígenas em nossa Diocese”. No âmbito do Jubileu da Esperança, “um tempo de renovação da fé, da justiça e do cuidado com a criação”, a carta afirma que “as palavras do Papa Francisco nos inspiram a ‘transbordar de esperança’ (cf. Rm 15,13).” Junto com isso, “este Jubileu convida a viver a misericórdia, o perdão e a defesa da vida. É um chamado para devolver as terras aos povos originários, cancelar dívidas que oprimem os pobres e lutar pela libertação de todas as formas de escravidão (cf. Lv 25)”, diz a carta. Os povos indígenas são definidos no texto como “guardiões das florestas, dos lavrados, bem como de tantos outros biomas. Vivem em harmonia com a Casa Comum”, colocando como exemplo disso o xamã yanomami Davi Kopenawa, “que recolhe os anseios de seu povo.” Sobre os Yanomami, os povos indígenas de Roraima afirmam que “podem dispor de tudo o que precisam e têm a responsabilidade de cuidar da floresta. Há milênios, os indígenas protegem não apenas seus territórios, mas também o equilíbrio do planeta.” Denúncia do modelo económico Diante da atual situação, a carta denuncia que “o modelo econômico, que idolatra o lucro e o dinheiro, provoca uma ruptura. Os avanços da derrubada da floresta, da pecuária extensiva, do monocultivo, dos megaprojetos e da mineração ameaçam a sobrevivência dos povos indígenas e a de todos nós. A harmonia da Casa Comum foi rompida pelos projetos de conquista e colonização, realizados de modo cruel, causando violências, dor e extermínio.” “Há 300 anos a Igreja em Roraima caminha ao lado dos povos indígenas, ouvindo seus clamores e sonhos. Juntos, construímos iniciativas que fortalecem suas comunidades: as cantinas (venda de produtos básicos a preços acessíveis) e o projeto M-Cruz (criação de gado), que garantem autonomia econômica; a formação em educação, saúde e gestão coletiva, que valoriza seus saberes; a luta pela demarcação de terras e a resistência contra invasões ilegais; o diálogo entre a fé cristã e as tradições indígenas, que cria pontes de respeito mútuo”, lembra a carta. O texto denuncia “a tese do Marco Temporal, que ameaça os direitos indígenas. Esta tese impõe e viola conquistas históricas e a Constituição Federal. Temos como exemplo a proposta da PEC 48 e da Lei 14.701/23, atualmente em vigor. Some-se a isso a criação da Câmara de Conciliação e Arbitragem pelo Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a questão. Ela ameaça retirar direitos e favorecer interesses econômicos. O nosso marco é ancestral!” A esperança dos povos indígenas permanece viva Nessa perspectiva, os povos indígenas insistem em que “essas leis trazem dor e sofrimento, mas a esperança dos povos indígenas permanece viva. Eles clamam pelo respeito a seus territórios, culturas e modos de vida.” Para isso, dizem renovar “nossa aliança e convidamos todos a se unirem nesta luta”, colocando algumas propostas: “exigindo a derrubada dessas leis injustas e tantas outras tentativas de retirada de direitos; apoiando a demarcação de terras indígenas; protegendo a floresta e seus guardiões.” Finalmente, é sublinhado que “a Páscoa de Cristo é a nossa Esperança, garantindo que a Vida vence a morte. A cruz não O derrotou – Ele a venceu! Esta Esperança não pode ser silenciada! Celebrar este Jubileu reforça que a vida triunfa. Juntos, escrevemos uma história de justiça e de paz para os povos indígenas e para toda a humanidade. Unidos, lutemos pela justiça e pela vida, testemunhando a Páscoa!” Ordenação diaconal O bispo diocesano, dom Evaristo Spengler disse que “este Jubileu é uma memória agradecida pela luta dos povos indígenas por seus direitos, pela terra e pela liberdade”, pedindo aos jovens indígenas que “não traiam seu povo, não deixem que caminhem sozinhos”, que assumam a causa de seus povos, para que possa ser respeitado o direito ancestral dos povos indígenas. Durante o Jubileu foi abordada a presença histórica da Igreja entre os povos indígenas de Roraima, com uma opção clara pelos povos indígenas, sobretudo a partir do episcopado de dom Aldo Mongiano, levando à criação do onselho Indígena de Roraima (CIR). A ordenação de Djavan André da Silva é “um dos preciosos frutos dessa longa história de aliança”, segundo dom Evaristo Spengler. Uma ordenação que se tornou um símbolo vivo dessa caminhada. Um momento que ficará marcado não apenas na história da Diocese de Roraima, mas também na memória dos povos indígenas que seguem firmes, unindo fé, cultura e resistência. Com informações de Rádio Monte Roraima

Francisco, o Papa que partiu com seus sapatos pretos

Até o fim, mesmo em sua despedida, Francisco foi fiel a ele mesmo. O último pontífice pode ser considerado um grande metrônomo, que sabia medir o tempo e os gestos. Como um bom jesuíta, ele colocou o ser humano e o fato de ser humano em primeiro lugar e acima de tudo. Esse reconhecimento foi manifestado em seu funeral, que se tornou um grande tributo do povo. Um povo que ele acompanhou até o fim, pois apesar de sua saúde delicada, ele quis estar no meio do povo até seu último dia, dando sua bênção no domingo de Páscoa. Ele partiu sob aplausos A simplicidade dos ritos fúnebres, o fato de ser enterrado com seus próprios sapatos, seus famosos sapatos pretos desgastados, lembram sua vida. O arcebispo que andava de metrô, o Papa que se locomovia em carros populares, jamais poderia partir em meio à pompa. Pelo contrário, ele partiu em meio aos aplausos, que reconheciam o fato de que ele havia se tornado pequeno, que ele queria e conseguiu ser um entre muitos, continuar a ser o padre Jorge. A homilia do Cardeal Re foi um retrato bem enquadrado de seu pontificado. As palavras e o tom de voz de um cardeal de 91 anos são dignos de admirar, dando voz às vivências do Papa que foi gradualmente perdendo sua voz. Uma voz que permanecerá como um legado, uma voz que “tocou mentes e corações”, como disse o cardeal. Amor concretizado na misericórdia Não há dúvida do amor de Francisco por Jesus, um amor que ele concretizou na misericórdia para com os descartados. Com isso, ele deixou claro que, em sua missão como pontífice, “não veio para ser servido, mas para servir e dar sua vida em resgate por todos”. Uma citação do Evangelho que foi lembrada pelo decano do Colégio de Cardeais, que também insistiu que “apesar de sua fragilidade e sofrimento final, o Papa Francisco escolheu trilhar esse caminho de doação até o último dia de sua vida terrena. Ele seguiu os passos de seu Senhor, o Bom Pastor, que amou suas ovelhas a ponto de dar sua própria vida por elas”. Essas ovelhas sempre tiveram o rosto das ovelhas perdidas, das ovelhas que a sociedade, e às vezes também a Igreja, descartou. Como o Cardeal Re reconheceu, ele prestou “atenção especial às pessoas em dificuldade, entregando-se sem medida, especialmente pelos menores da terra, os marginalizados”. Eles, os mais simples, o entendiam bem, ele falava a língua deles, o jargão do povo, sabia como arrancar um sorriso deles, sabia como fazer uma piada. “Ele tinha uma grande espontaneidade e uma maneira informal de se dirigir a todos”, disse o cardeal em sua homilia. Como bom torcedor, ele sempre provocava os brasileiros com a seguinte pergunta: “Quem é melhor, Pelé ou Maradona?” O Papa das periferias Um Papa de todos, todos, todos, como a Igreja que ele sonhava, “ávida por assumir os problemas do povo e os grandes males que dilaceram o mundo contemporâneo; uma Igreja capaz de se inclinar para cada pessoa, para além de qualquer credo ou condição, curando suas feridas”, como lembrava o decano do Colégio Cardinalício. Um Papa das periferias e que acima de tudo viajou para as periferias, iniciando suas viagens em Lampedusa, quase sempre marcadas por estar ao lado dos invisíveis para os detentores do poder, que por outro lado não deixaram de estar ao lado de seu caixão, a grande maioria reconhecendo sua grande contribuição para um mundo ferido por guerras, pobreza, polarização e tantas outras feridas que ele se esforçou para curar seguindo o exemplo do Bom Samaritano. Uma cura de feridas que levaria a concretizar do Evangelho da misericórdia, que sempre foi a força motriz de sua vida, desde os tempos em que andava pelos becos das favelas de Buenos Aires, para tornar visível que Deus sempre perdoa e perdoa a todos. E fazer isso com alegria, com a Alegria do Evangelho, deixando de lado a cultura do descarte e assumindo a do encontro e da solidariedade, da vida em fraternidade, ideias presentes na homilia de seu funeral. O cuidado de todas as criaturas Francisco, sempre preocupado com o cuidado de todas as criaturas, seguindo o exemplo do poverello de Assis. O Papa da ecologia integral, e como lhe somos gratos por isso nós que vivemos na Amazônia, pela qual ele sempre se preocupou e na qual concretizou sua proposta de caminhar juntos como Igreja, na sinodalidade, construindo pontes e não muros. Por isso, pedimos a ele, como fez o Cardeal Re, que reze por nós, para que sua memória e seus ensinamentos continuem presentes entre nós, para que nos mova a continuar fazendo bagunça, construindo um mundo menos complicado e uma Igreja menos complicada, onde o Evangelho marque o caminho a seguir, onde os últimos possam ser os primeiros, aqueles que usam sapatos velhos ou que, muitas vezes, nem têm sapatos.