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Dia: 23 de setembro de 2023

Padre Zenildo Lima: “Não pode haver missão se não tocar uma corporeidade ferida e machucada”

Refletir sobre a relação entre Missão e Reino foi um dos propósitos do Congresso Missionário Regional Norte1, que acontece na Maromba de Manaus de 22 a 24 de setembro, com a participação de umas 80 pessoas. Um Reino que nos ajuda a entender que “o Cristo se faz corpo, se faz carne”, que “não pode haver missão se não tocar uma corporeidade ferida e machucada”, segundo o padre Zenildo Lima, reitor do Seminário São José da Arquidiocese de Manaus. Segundo ele, “o horizonte da missão não pode se reduzir à Igreja e a uma Igreja sacramental, o horizonte é muito maio, o horizonte é o Reino”. Daí a importância de “partir da realidade, da vida do povo”. Uma reflexão que foi iluminada por Dom Luiz Fernando Lisboa, bispo da diocese de Cachoeiro de Itapemirim e membro da Comissão para a Ação Missionário e Cooperação Intereclesial da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que refletiu sobre “Missão a anúncio do Reino de Deus”. Segundo o bispo, missão é participar ao lado de Deus de sua intenção de amar e promover o ser humano e toda a Criação. Ele insistiu em que a missão é de Deus, é “um movimento voltado para a promoção da vida e do ser humano, de toda a Criação”. Ele lembrou as palavras de Dom Helder Câmara sobre a Missão: “Missão é partir, caminhar, deixar tudo, sair de si, quebrar a crosta do egoísmo que nos fecha no nosso Eu. É parar de dar volta ao redor de nós mesmos, como se fôssemos o centro do mundo e da vida. É não se deixar bloquear nos problemas do pequeno mundo a que pertencemos: a humanidade é maior. Missão é sempre partir, mas não devorar quilómetros. É sobretudo abrir-se aos outros como irmãos, descobri-los e encontrá-los. E, se para encontrá-los e amá-los é preciso atravessar os mares e voar lá nos céus, então Missão é partir até os confins do mundo.” O bispo de Cachoeiro do Itapemirim apresentou a missão como anúncio (Kerigma), koinonia (comunhão), diakonia (serviço), martirya (testemunho). Segundo ele, o Reino de Deus é essência, é a totalidade do que Jesus veio anunciar, um Reino de justiça e de paz. Dom Luiz Fernando lançou uma pergunta: “Quem é esse Jesus que anunciou o Reino?”, advertindo contra uma visão reducionista e errada, e dizendo que é preciso responsabilidade para falar de Jesus. O bispo ressaltou que “a vida de Jesus é provocativa, desinstala, nos faz sair de nós para ir ao encontro do outro. Jesus é a ponte que nos liga ao Pai”. Lembrando as palavras do teólogo José Antonio Pagola, mostrou Jesus como poeta da compaixão, curador da vida, defensor dos últimos. Basta vermos com quem Jesus andava, os últimos, os mais pobres, os desfavorecidos, os vulneráveis, afirmou o bispo, que também disse que segundo Pagola, na vida de Jesus o lugar central foi ocupado por Deus e seu projeto do Reino. Também recordou as palavras de Jon Sobrino, que advertiu em relação ao perigo de apresentar “um Cristo sem Reino”, que relega a segundo plano as exigências da mediação do Reino. Dom Luiz Fernando insistiu em um Jesus encarnado, que como ser histórico deixou sua ação e mensagem com a finalidade de fazer a vontade do Pai, que se traduz no Reino de Deus. “Entender a missão na Igreja sem esse entendimento de Reino de Deus é difícil”, enfatizou o bispo de Cachoeiro do Itapemirim. Anunciar esse Jesus que veio anunciar o Reino de Deus. Ele retoma a imagem de Deus pastor, com ternura infinita, com amor pelas pessoas mais desprotegidas, disse Dom Luiz. Segundo o membro da Comissão para a Ação Missionária da CNBB, a “senha” para a vida eterna está no capítulo 25 de Mateus, que atualiza a presença de Jesus nos fracos, nos pequenos, nos vulneráveis, nos excluídos, nos estigmatizados, insistindo em que “na carne do pobre sofre a carne de Jesus”. É por isso que “os misericordiosos não têm motivo de temer o julgamento”, disse o bispo. Segundo ele, “no julgamento não se pede nada de religioso e sim como se relacionaram com os irmãos e irmãs a começar pelos últimos”. De acordo com esse texto os não cristãos que amam o próximo podem se salvar, afirmou. Ele destacou a necessidade de ações concretas por amor ao ser humano, ressaltando que só contarão os atos de serviço ao próximo, ter cuidado com a caridade e dignidade, a prática da justiça traduzida em solidariedade e partilha dos bens. Viver o amor aqui e agora, “o Reino de Deus é e sempre será dos que amam o pobre e o ajudam em suas necessidades”, enfatizou. “A missão é anúncio do Reino de Deus, onde quer que estejamos”, disse dom Luiz Fernando. Segundo ele, se queremos ser continuadores da missão de Jesus temos que nos comprometer com ele, que está ressuscitado, mas continua crucificado naqueles que sofrem. Por isso, missão não é só dar, é receber, aprender, compartilhar, tirar as sandálias, respeitar o modo de ser do outro, é proclamar o Reino de Deus. Dom Luiz Fernando Lisboa lembrou sua experiência como bispo de Pemba (Moçambique), destacando “quanto eu aprendi com aqueles povos a quem eu tentei servir”. Ele falou sobre como “Deus se apresentava escandalosamente” nas pessoas que iam ao seu encontro, às vezes para pedir pão, remédio, educação, transporte, afirmando que “o missionário tem que estar disposto a tudo”. Mas ele também insistiu em que muitas vezes se apresentava para entregar uma espiga de milho, uma mandioca, um punhadinho de amendoim, uma cana. Fazendo uma leitura disso, disse que o que estava por traz era “uma vontade de interação, de ser irmão, de ser escutado, de ser valorizado, de dizer eu estou aqui, eu conto, eu quero atenção, eu quero mostrar o que eu sei, o que eu sou”. Ele disse ter aprendido muito “em termos de solidariedade, em termos de partilha”. Na missão, “o Reino de Deus não precisa ser levado, ele já está ali, e preciso descobri-lo, valorizá-lo…
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Ir. Regina da Costa Pedro: “A comunhão com as outras Igrejas é constitutiva da natureza de cada Igreja local”

O Congresso Missionário Regional Norte1 é um momento importante em preparação para o 5º Congresso Missionário Nacional que será realizado em Manaus de 10 a 15 de novembro. Uma oportunidade para refletir sobre a responsabilidade da Igreja local pela missão aos confins do mundo, uma temática abordada pela Ir. Regina da Costa Pedro, diretora das Pontifícias Obras Missionárias no Brasil. A religiosa do PIME iniciou sua fala questionando a vinculação da Igreja local com a Igreja universal na dimensão missionária, os avanços que estão se dando e em que medida as igrejas locais precisam se converter na dimensão pastoral-missionária, e os sinais dessa conversão. “A Igreja é, por sua natureza, missionária”, ressaltou a Ir. Regina Pedro, que incidiu em que “a missão e a fé cristã andam sempre juntas, e só é possível assumir e viver a missionariedade e cooperar na missão a partir da fé”. Partindo da ideia da Igreja Corpo de Cristo, a diretora das POM Brasil questionou como o Concílio Vaticano II vê as “Igrejas locais” e quais as implicações dessa visão, fazendo um chamado a redescobrir o significado da “Igreja local” no Vaticano II e a relação entre a Igreja universal e as igrejas locais, o que é conhecido como teologia da comunhão, pois “a comunhão com as outras Igrejas (no sentido de reciprocidade e solicitude de cada uma para com todas) é constitutiva da natureza de cada Igreja local”. Segundo a diretora das POM Brasil, “a missão é essência da Igreja universal e local”, ressaltando que a missão “é o fim da existência da Igreja”, até o ponto de que “é Igreja verdadeira se testemunhar que Deus ama não somente a nós, mas a todos”. É por isso que “a Igreja é ‘local’ para indicar o lugar a partir do qual deve olhar o mundo, e não para indicar o lugar onde encerrar o nosso olhar”. Ninguém pode esquecer que “as igrejas locais são necessariamente missionárias e sua missão é universal”. De fato, a Igreja local é sujeito da missão universal e enviada aos que não creem. Por isso, a responsabilidade das igrejas locais na cooperação missionária, da missão ad gentes, centrada em Deus, e exigências para todas as igrejas locais. A religiosa refletiu sobre a conversão missionária que tem que levar a Igreja a um estado permanente de missão, nas estruturas e consciência de que todos são chamados a colocar-se em estado permanente de missão. Nessa conversão, o Papa Francisco chama a cinco saídas estratégicas: das estruturas caducas, de si mesmos, das relações excessivamente hierárquicas, de uma pastoral de manutenção, das fronteiras. Uma conversão que leve a entender que “missão é vida, não só ação”, não é só programática, é paradigmática, “é pedido aos discípulos para construírem a sua vida pessoal em chave de missão”. É entender, seguindo as palavras do Documento 100 da CNBB, a exigência de “passar de uma pastoral ocupada apenas com as atividades internas da Igreja, a uma pastoral que dialogue com o mundo”. Uma conversão missionária que leve a não deixar as coisas como estão, segundo fala o Papa Francisco em Evangelii Gaudium. Uma reflexão que deve ser levada as igrejas locais, às paróquias e comunidades do Regional Norte1. Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1

A Igreja do Regional Norte 1: Iluminação do texto de Lc 4,14-16

O Regional Norte 1 se reuniu para continuar refletindo sua caminhada como Igreja nessa realidade bem específica na região Amazônica. Com o intuito de continuar testemunhando e vivenciando a experiência de uma Igreja encarnada nessa realidade da Amazônia, faz-se necessário reunir-se em conjunto (leigos/as, religiosos/as, padres e bispos) buscar luzes para enxergar melhor a caminhada ecleial, atitude que nem sempre é fácil ou simples, porém, necessária. É o sentido da “Sinodalidade” que as Igrejas locais e a Igeja como um todo está vivenciando. Sempre buscando manter-se vigilante em sua proposta de fidelidade a Jesus Cristo e seu Reino de vida e justiça, proposta que sempre está em dissinância com o projeto de quem busca acúmulo e riqueza e de propostas e projetos de fé desencarnados da realidade de uma Igreja comprometida com a vida em sua concretude econômica, social e religiosa, como está lembrando sempre o Para Francisco. É nessa direção que a Igreja do Regional Norte 1 busca ser fiel e por isso, nem sempre é compreendida e até sofre críticas e muitas das vezes desonestas (por exemplo críticas aos bispos). Olhando nos Evangelhos, aqui de maniera mais especíca Lucas (escrito por volta de 80/90), com a proposta de abrir-se para missão além da região da Palestina acolhendo os povos não judeus (gentios), percebemos justamente esse projeto de anunciar a mensagem de Jesus que se concretiza na realidade em Nazaré, a terra de Jesus, que deve se estender a todas as nações (Lc 24,47), em cumprimento das promessias antigas. Na compreensão e propósito Lucas teve a intenção de integrar “os atos salvíficos de Deus na história universal, tendo o evento-Cristo como centro definidor. O próprio Lucas provavelmente teria dito de outro modo: a história do mundo e seus impérios estão integrados à história universal dos atos salvíficos de Deus”, segundo afirma M. Eugene Boring em sua Introdução ao Novo Testamento. Assim a mensagem evangélica deve ser encarnada na realidade de nossa Igreja como pensa o Regional Norte 1. Na linha profética, Lucas faz uso de textos proféticos justificando essa realização: Is 61,1-2; 58,35; Lv 25,8-55. Mostrando assim, que em Jesus a profecia foi cumprida. O projeto se realiza em Jesus, pois ele foi confirmado pelo Pai (Lc 3,21-22), e está peno do Espírito Santo. Por isso, ele é autorizado para atualizar as palavras antigas da profecia. Essa profecia para Lucas se realiza na história concreta do povo de seu tempo. O povo excluído (os pobres, os presos, os cegos, os oprimidos, Lc 4,18-19) recebe essa Boa Notícia de libertação e salvação, de vida digna mesmo. É o “ano da graça do Senhor” (jubileu do Levítico 25) que está se realizando. O anúncio da Boa Nova não acontece desencarnado da realidade, sem chão ou raiz (cuidar só das almas), mas se realiza dentro da vida de um povo, de uma cultura bem concreta. Aqui está a beleza, preocupação e o compromisso da Igreja do Regional Norte 1 em continuar sendo fiel à proposta evagélica que se realiza aqui e agora na realidade das Igrejas locais da Amazônia, tão ameaçada e explorada. Por isso, uma Igreja viva não compactua com essa situação de degradação da vida na Amazônia em toda sua diversidade de fauna e flora e a vida humana igualmente em toda sua diversidade e riqueza. Os documentos Pontifícios (Laudato Si), da Igreja Continental (Documentos do CELAM) e local, estão sempre iluminando a opção da Igreja do Regional Norte 1 na fidelidade ao projeto do Reino de Deus. Projeto esse que vem sendo ao longo dos anos pensando, refletido e executado na medida do possível nas Igreja locais. José Roberto da Silva Araújo, OMI

Palavra e espiritualidade missionária alimentos para toda vida missionária

A importância da Palavra e da espiritualidade na missão foram elementos abordados na reflexão do Congresso Missionário Regional Norte1 que está sendo realizado na Maromba de Manaus de 22 a 24 de setembro de 2023, em preparação ao 5º Congresso Missionário Nacional, que também será sediado na capital do Amazonas de 10 a 15 de novembro de 2023. Analisando o texto que relata a experiência dos dois discípulos a caminho de Emaús, que inspira o lema do Congresso Missionário Nacional e Regional, o padre Tiago Camargo refletiu sobre “o diálogo, a partilha, o dar a conhecer ao outro as ideias e pensamentos perpassavam aquela caminhada”, vendo no texto a presença de situações que fazem parte da vida das pessoas hoje. O assessor da Comissão para a Ação Missionária e Cooperação Intereclesial da CNBB chamou a ver o Congresso como mais um passo que damos no caminho da vida missionária, a se “deixar interpelar pelas tristezas e desilusões daqueles que vamos encontrando”. De fato, ele destacou que “a missão evangelizadora pelo testemunho vai ao encontro desses que estão com o rosto sombrio pela dor, pela morte, pelo luto, pelo medo, pela violência, pelo desespero ou pela desesperança”, fazendo um chamado a se aproximar com atitude de acolhimento, e questionando no caminho de quem os missionários colocam seus pés. O assessor lembrou a importância da Palavra, “que alimenta a espiritualidade do seguimento a Jesus Cristo”, questionando como ela atinge a vida missionária, e destacando a importância de conhecê-la. A mesma coisa com a Eucaristia, onde “o Espírito Santo fortalece a identidade do discípulo e desperta nele a decidida vontade de anunciar”, afirmou citando o Documento de Aparecida. Segundo o padre Tiago Camargo, “não é possível encontrar verdadeiramente Jesus Ressuscitado sem ser inflamado pelo desejo de contar a todos”, que insistiu no constate chamado à missão, pois “a missão recebida da Trindade, não tem limites de fronteira, de tempo ou lugar”. Abordando a questão da espiritualidade missionária, dom José Altevir da Silva, bispo da Prelazia de Tefé, começou se perguntando: “será que existe mesmo uma espiritualidade Missionária?”, afirmando que “todo ponto de partida é o chão onde nossos pés estão pisando”, destacando a importância do “chão histórico que reverte o nosso ser” e que determina o atual modelo de desenvolvimento, que definiu como irracional, “capaz de colocar numa cilada fatal à própria existência da humanidade, ao meio ambiente, aos territórios, à nossa Casa Comum, causando a grande e atual crise civilizacional”. O bispo denunciou “as consequências daninhas de um perverso colonialismo”, que atinge a espiritualidade missionária. Algo que dom Altevir mostrou presente na Laudato Si´, fazendo um chamado a que a espiritualidade missionária, no contexto amazônico, passe por diversas dimensões. Ele lembrou da “ecologia do espírito”, chamando a ver a experiência espiritual como “uma ferramenta poderosa na luta contra a hegemonia cultural, econômica e política do sistema-mundo capitalista ocidental”. Daí chamou a uma reflexão sobre espiritualidade em chave decolonial, a buscar agentes “autenticamente aptos a encarar os desafios da decolonialidade e da interculturalidade”. Após oferecer diversas definições de espiritualidade, o bispo da prelazia de Tefé disse que “da Memória e do Projeto são feitos os bastões da caminhada missionária”. Ele lembrou as palavras do Papa João Paulo II: “o missionário deve ser ‘um contemplativo na ação’”, afirmando que “a missão cristã tem como primordial finalidade revelar o Mistério”. Dom Altevir fez um chamado a descobrir que “as pessoas precisam hoje de proximidade”, de ser missionários com “um coração de cuidador dedicado ao cuidado dos irmãos e irmãs”. Querendo definir a espiritualidade libertadora, o bispo a vê como união entre oração e ação, sagrado e profano, fé e compromisso com a justiça, como algo vivencial, que contempla Deus e seu Espírito na realidade, nos conflitos, no sofrimento humano, que organiza a esperança dos pobres e excluídos, que é ecumênica, servidora e samaritana, resiliente. O bispo colocou sete passos para fortalecer a espiritualidade missionária, afirmando que é importante seguir a pedagogia de Jesus, juntos aos discípulos de Emaús: o encontro, a escuta, a realidade, a palavra, a acolhida, o celebrar e a missão. Com eles, “teremos elementos suficientes para alimentar a espiritualidade missionária”. Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1