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Sala Sinodal em mesas redondas, diversidade e método marcam o início da Assembleia

O final da primeira semana da Assembleia Sinodal do Sínodo sobre a Sinodalidade, meia semana se não contarmos o retiro anterior de domingo a terça-feira, embora muitos concordem que foi um momento de grande importância para o que está sendo vivenciado e será vivido nesta assembleia, é um bom momento para fazer uma primeira avaliação. A participação de toda a Igreja O primeiro aspecto a ser destacado é a participação de toda a Igreja. Por se tratar de um Sínodo dos Bispos, a presença de não bispos é algo que enriquece o processo, embora alguns membros do Sínodo, desrespeitando o pedido de silêncio do Papa Francisco, tenham se manifestado contra a presença de não bispos, especialmente mulheres, com direito a voz e voto. E é preciso dizer que as mulheres, especialmente as religiosas, têm sido protagonistas positivas nesses primeiros dias. Em segundo lugar, a disposição da sala do sínodo, com 35 mesas redondas distribuídas na Aula Paulo VI. Uma maneira de estar com os outros, olhando nos olhos, que ajuda a tornar a escuta mais atenta e o diálogo mais franco, com a consequente melhoria do processo de discernimento comunitário. Essa disposição também ajuda na dinâmica dessa primeira sessão da Assembleia Sinodal. As tensões, que existem em alguns círculos menores, não prejudicam o fluxo geral da assembleia, e evita que algumas pessoas, protegidas por sua posição de autoridade eclesiástica, monopolizem a voz da assembleia, algo que aconteceu em sínodos anteriores. Conversação espiritual Com relação ao método de trabalho, o discernimento comunitário à luz da conversa espiritual é muito mais do que um formato diferente. Os participantes destacam os momentos de silêncio, tanto nos círculos menores como nas chamadas congregações gerais, quando os 35 grupos em que se divide a assembleia, que serão renovados ao final de cada um dos módulos, compartilham suas experiências, algo que em muitas dessas comunidades de discernimento comunitário nasce de uma grande diversidade de origens, culturas, formas de viver a fé e de ser Igreja. É aqui que há espaço e tempo para que todos entrem em seu próprio ritmo. É um caminho lento, mas que está ajudando a se apropriar de um modo de ser Igreja ao qual muitos não estão acostumados e que, podemos dizer, ainda provoca desconfianças, especialmente entre aqueles que defendem um modo de ser Igreja marcado pelo clericalismo. Não nos esqueçamos de que esse é um dos pecados que o Papa Francisco sempre condena e que esta Igreja sinodal, onde se caminha juntos e juntas, na qual se escuta e se dialoga com todos e todas para discernir em comum, busca superar. Um caminho indicado pelo pequeno Uma Igreja na qual o caminho e o ritmo não são mais marcados pela autoridade, mas pelas vozes que, a partir do pequeno, indicam onde continuar dando passos como Igreja. E para isso, o método da conversa espiritual é decisivo, porque Deus se faz presente na brisa suave e não no vento impetuoso. Isso é algo que tradicionalmente tem sido experimentado nas Igrejas Orientais, onde a sinodalidade, a prática de caminhar juntos, sempre foi muito mais evidente. Sua presença na Assembleia Sinodal é um instrumento de aprendizado, pois as diferentes denominações cristãs presentes ajudam a olhar de outra perspectiva, a valorizar outros elementos que ajudam a continuar dando passos. Após os primeiros dias de reflexão sobre o tema: “Por uma Igreja Sinodal. Uma experiência integral”, aprofundando os sinais característicos de uma Igreja sinodal e a maneira de assumir esse modo de ser Igreja, a conversa no Espírito, os membros do Sínodo entrarão no segundo módulo do Instrumento de Trabalho que trata dos três temas prioritários para a Igreja sinodal: comunhão, missão, participação. Daí a pergunta que é o ponto de partida e deve marcar o discernimento neste segundo momento que começa na segunda-feira: “Como podemos ser mais plenamente sinal e instrumento da união com Deus e da unidade do gênero humano?“. Uma nova reflexão sobre o amor a Deus e ao próximo, que mostra àqueles que têm medo do Sínodo que ele é mais um passo para entender e viver melhor o Evangelho. Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1

Cardeal Ambongo: Na Assembleia Sinodal “a autoridade vem do Batismo, é por causa do Batismo que estamos aqui”

A primeira coletiva de imprensa com a presença dos membros da primeira sessão da Assembleia Sinodal do Sínodo sobre a Sinodalidade, que acontece na Sala Paulo VI do Vaticano de 4 a 29 de outubro, foi realizada neste sábado na Sala Stampa vaticana. Um cardeal africano e uma religiosa migrante Aos tradicionais relatórios de Paolo Ruffini, prefeito do Dicastério para a Comunicação da Santa Sé e presidente da Comissão de Comunicação do Sínodo, assistido diariamente por Sheila Leocádia Pires, secretária da mesma comissão, juntou-se a irmã Leticia Salazar, Irmã da Companhia de Maria e Chanceler da Diocese de San Bernardino (Estados Unidos) e o Cardeal Fridolin Ambongo Besungo, Arcebispo de Kinshasa (República Democrática do Congo), que está participando como Presidente do Simpósio das Conferências Episcopais da África e Madagascar (SECAM). A primeira semana da Assembleia sinodal está terminando, onde foi concluída a seção A do Instrumento de Trabalho, que Ruffini considera rica em eventos, tendo abordado as características de uma Igreja sinodal e experimentado a grandeza da Igreja e sua unidade. O prefeito do Dicastério transmitiu a gratidão do Papa pelo trabalho dos jornalistas. Destaques dos primeiros dias Os principais temas dos primeiros dias foram lembrados, entre outros, a formação em todos os níveis de todos os batizados, especialmente nos seminários, a experiência de comunhão por parte da hierarquia e como encontrar novas formas de participação na comunhão, afirmando que a sinodalidade é uma atitude espiritual que requer estruturas e passando do conceito de poder para o conceito de serviço, sendo uma Igreja acolhedora, que supera o clericalismo e valoriza o papel dos leigos, que está com os pobres, especialmente com os migrantes. Uma assembleia sinodal cujos membros receberam na sexta-feira à tarde o livro do Papa Francisco “Santos, não mundanos“, e que na quinta-feira à tarde peregrinarão às Catacumbas de Santa Domitila, um lugar de importância na vida da Igreja se nos referirmos às primeiras comunidades cristãs, ou mais recentemente ao Concílio Vaticano II ou ao Sínodo para a Amazônia, e aos pactos ali assinados. Os membros da assembleia são convidados a rezar e têm desfrutado da presença de Francisco em todas as congregações gerais, que está sempre entre os primeiros a chegar e conversa abertamente com os presentes no salão sinodal. Estar abertos e aprender com todos A Irmã Leticia Salazar disse que participou de vários Capítulos Gerais da Companhia de Maria, mas enfatizou que essa experiência é diferente, é uma experiência com toda a Igreja, “ela nos permite estar abertos e aprender com todos“. Nascida no México, ela emigrou com sua família para os Estados Unidos aos 17 anos, enfatizando que foi a Igreja Católica que a acolheu. Este é o quarto sínodo do qual o Cardeal Ambongo participa, e ele destacou que cada um chegou à Assembleia Sinodal com suas próprias esperanças, “mas pouco a pouco entramos no processo e percebo que este Sínodo não é como os outros dos quais participei“. Reconhecendo que ninguém sabe como ele terminará, ele enfatizou a importância de que “somos irmãos e irmãs ouvindo a vontade de Deus para sua Igreja”, que ninguém veio com uma agenda para impor. Um Sínodo que está sendo vivido com alegria e confiança, em um clima positivo, e onde o que sair será acolhido como a vontade de Deus, dizendo estar convencido de que dará muitos frutos para a Igreja. Importância do método de discernimento comunitário Um Sínodo que só terá resultados no final da segunda sessão da Assembleia Sinodal, em outubro de 2024, por isso os temas, algo que ele disse em relação aos ministérios ordenados, são tratados, mas não para decidir algo e sim para ver o que o Espírito nos diz em relação a esse tema, ressaltando a necessidade de ouvir para descobrir a vontade do Senhor. Para isso, é importante o método escolhido, o discernimento comunitário, porque “ninguém pode dizer que eu sei qual é a vontade de Deus”, enfatizou o cardeal. Um método no qual “buscamos juntos a melhor solução para o problema neste momento”, o que garantirá que “o resultado seja o mais próximo possível do que podemos considerar ser a vontade de Deus”. Um trabalho feito em conjunto, porque “a autoridade vem do Batismo, é por meio do Batismo que estamos aqui“. Nos círculos menores, é necessária a maioria para aprovar os relatórios, que são apresentados à congregação geral, onde todos podem reagir, e depois as comunidades de discernimento discutem novamente o que foi ouvido na congregação geral, elaborando um relatório final a ser apresentado à secretaria do Sínodo. Uma Igreja com traços sinodais A Ir. Leticia Salazar compartilhou o trabalho que a Diocese de San Bernardino realiza com os migrantes latino-americanos, onde há 30 anos refletem sobre como ser uma Igreja acolhedora, com traços sinodais, que busca a integração das pessoas, afirmando que o tema da migração faz parte do discernimento sinodal e é necessário continuar a aprofundar o que significa ser irmãos e irmãs. Como o cardeal africano, a religiosa insistiu que “foi o Batismo que nos trouxe até aqui”, enfatizando a importância da oração, que “nos permite ver coisas que nunca vimos antes, nos permite abrir-nos a novas possibilidades“. Isso exige muita atenção à Palavra de Deus, às vozes que escutamos, não se trata apenas de nossa experiência pessoal e isso se expressa livremente nos círculos, enfatizou, porque é aqui que “o que Deus está nos dizendo é revelado, isso é discernimento comunitário, é uma comunidade que atinge a meta”. Nesse sentido, destacou que “muitas vezes as pessoas não entendem o que é sinodalidade, que não é um conceito, é a experiência de se sentir incluído, escutado”. Para o Cardeal Ambongo, “a formação no espírito da Igreja sinodal é fundamental, todos nós temos que nos deixar formar no espírito da sinodalidade“. A partir daí, ele disse que “não é o Sínodo que resolve problemas particulares, mas o Sínodo que define a nova maneira de enfrentar os problemas no espírito da sinodalidade”. Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1

Mesas redondas que geram caminhos de esperança em uma Igreja sinodal

Ser uma fonte de esperança para uma Igreja onde haja espaço para todos, todos, todos. Poderíamos dizer que esse é um dos desafios do Sínodo sobre a Sinodalidade, que está realizando a primeira etapa da Assembleia Sinodal na Sala Paulo VI, no Vaticano, de 4 a 29 de outubro. Um ponto chave para a vida da Igreja Não podemos nos esquecer de que a esperança é um ponto chave para a vida da Igreja, especialmente para aqueles que passaram por experiências difíceis, dolorosas e desafiadoras. São essas pessoas que esperam que a Igreja as ajude a encontrar uma luz que as abrirá para um modo de vida diferente, a superar o medo, a entender que, ao viver em docilidade ao que o Espírito Santo quer dizer, a pessoa encontra o caminho da vida. Uma esperança que está inerente em todos aqueles que acreditam na Ressurreição, em todos e todas os que se sentem o povo do Ressuscitado, o povo da esperança. A experiência do Sínodo está ajudando a muitos dos que são membros da Assembleia Sinodal a viver a experiência de uma Ressurreição. Parece que estávamos na tumba, tudo frio, tudo derrotado, com aquele sentimento primeiro dos discípulos de Emaús. Um Sínodo para encontrar-se com o Ressuscitado Diante disso, o Sínodo sobre a Sinodalidade está fazendo com que muitas pessoas se encontrem com o Ressuscitado. É a esperança que faz parte da vida daqueles que passam por experiências difíceis em seu cotidiano, em seu dia a dia. Na secura vivenciada por tantos homens e mulheres mundo afora, às vezes, uns pingos de chuva fazem com que a terra da vida cobre um sabor diferenciado, uma cor nova, o broto começa a nascer da semente que foi plantada. Uma experiência que está sendo vivida nesse Sínodo, que mais do que uma novidade é um despertar de algo que já existia, que já existe, e que hoje está se revelando, se abrindo. É o túmulo que se abre e o Ressuscitado que aparece e traz a esperança que brota da vida em plenitude. Muitas pessoas apontando caminhos para uma Igreja sinodal O fato de ver tantas pessoas que de diferentes modos, dentro e fora da sala sinodal, estão apontando caminhos para ser uma Igreja sinodal é um sinal de esperança que leva a acreditar que a Igreja está no caminho certo, que está superando os medos, pois quem tem esperança não tem medo da novidade, medo de caminhar junto. Um modo de se colocar a caminho que leva a ter a certeza de que no caminho podemos encontrar tropeços, pedras, mas sobretudo alegria, companheiros e companheiras, gente em sintonia diante dos mesmos problemas. Um Sínodo que está sendo uma oportunidade para apontar caminhos para a esperança em algo novo, para uma revelação de algo que estava escondido na Igreja, porque a Igreja sinodal, ela já existe. Talvez ela tivesse sido esquecida, talvez muitos nem a conheciam. Mas estamos diante de um chamado que nos leva a assumir a necessidade de resgatar, de recuperar. Como Madalenas se faz preciso anunciar essa Igreja da esperança, essa Igreja sinodal onde todos se propõem caminhar juntos, algo que é bem mais do que dar as mãos e caminhar, é perceber que nós temos erros e que no caminho somos chamados a acertar esses erros, acolhendo todos e todas sem exclusão de ninguém. Essas mesas redondas onde se olhando aos olhos, os membros do Sínodo, homens e mulheres chegados de todos os cantos da Igreja buscam discernir esses caminhos de esperança. Um modo de ser Igreja a ser assumido em tantos lugares onde a esperança é necessária para não duvidar que Deus sempre está com todos, todos, todos. Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1

Padre Vanthuy Neto: A encíclica “Lacrimabili statu” de Pio X sobre os indígenas foi um texto iluminado

Antecipador de questões como os direitos humanos e o direito à própria terra. O padre Vanthuy Neto, professor de História da Amazônia, da diocese de Roraima, “lê” para nós o documento escrito em 1912, depois que o Papa viu os relatórios dos missionários beneditinos desse canto do Brasil. Era 1912, 108 anos antes da exortação apostólica Querida Amazônia, do Papa Francisco. Pio X escreveu uma carta encíclica, Lacrimabili statu, que era uma denúncia precisa e circunstancial da situação inaceitável em que os povos indígenas da América Latina, e em particular da Amazônia, eram obrigados a viver. Era um texto antecipatório, que mostrava o “coração pastoral” do Papa Sarto, capaz de se expandir para o mundo inteiro e para situações inéditas, chegando implicitamente a falar de “direitos humanos”. Sobre a importância desse texto, entrevistamos o padre Vanthuy Neto, chanceler da diocese de Roraima e professor de História da Amazônia. Ele nos responde enquanto conversa com o padre Edy Savietto, missionário fidei donum de nossa diocese, em Roraima. Uma “ponte” entre duas dioceses que também acontece em nome de São Pio X, cuio corpo está peregrinando nesses dias na diocese de Treviso, onde ele nasceu.  Qual é a importância do texto de Pio X de mais de 100 anos atrás? O que ele representou para os povos indígenas? A encíclica do Papa é um documento que nasce das denúncias precisas dos missionários da época, principalmente da região de Roraima, onde os beneditinos estavam presentes, em um contexto em que os indígenas eram tratados com grande violência. Outras notícias vieram da Amazônia peruana. A encíclica retoma quase literalmente as notícias que vieram dessas áreas. Lembro-me de que a área pan-amazônica é aquela onde ainda hoje existe a maior diversidade de grupos étnicos indígenas do mundo. Essa grande região sofreu uma grande “invasão por motivos econômicos” na virada dos séculos XIX e XX. Isso ocorreu, sobretudo, por causa da abundância da borracha. A Amazônia era considerada um “inferno”, era chamada de “inferno verde”. Temia-se pragas, febres e epidemias, mas foi aqui que a borracha foi descoberta. A Amazônia foi subitamente revelada ao mundo por seu potencial econômico. Evidentemente, a notícia chegou ao Vaticano, que começou a exercer sua atenção espiritual sobre essas regiões. Leão XIII já havia dividido a região amazônica em duas jurisdições eclesiásticas, Belém e Manaus, e envolveu muitas ordens e congregações nessa grande obra de evangelização, incluindo os dominicanos, xaverianos, beneditinos, franciscanos, jesuítas etc. A encíclica é, de fato, o resultado dessas informações, enquanto na Europa predominava uma cultura “positivista”, segundo a qual os povos europeus traziam um “mais”, um avanço, em relação aos povos considerados primitivos. Os missionários descobriram que os povos indígenas eram maltratados até mesmo pelos próprios cristãos. Assim, o boom econômico e os povos exterminados, que passaram de maioria a minoria, são os dois pontos abordados no Lacrimabili statu, aos quais se deve acrescentar a denúncia do Papa Pio X sobre a violência que essas populações continuaram a sofrer. Deve-se levar em conta que os povos originários somavam cerca de cinco milhões e haviam se reduzido a apenas seis mil na região brasileira.  A encíclica de Pio X fala dos relatórios dos missionários. Qual foi a importância de suas ações e escritos ao longo das décadas? A encíclica criou uma consciência especial sobre os povos originários e o papel dos missionários. A primeira coisa que ficou muito clara foi que os missionários, em seu trabalho de evangelização, não concordavam de forma alguma com práticas violentas contra os povos indígenas. Em segundo lugar, havia uma forte preocupação da parte deles de que os indígenas não fossem tratados como uma raça inferior. Os beneditinos de Roraima falam de uma prática em que eles eram marcados com um ferro incandescente, como se fossem animais. Isso é claramente afirmado na encíclica. Outro ponto diz respeito aos direitos dos povos indígenas com relação à sua terra e posse. Essa encíclica antecipa uma noção, a dos direitos humanos e dos direitos dos povos indígenas, que surgirá claramente sessenta anos depois. Podemos realmente dizer que essa é uma carta iluminada e inspirada. A carta revela um aspecto do Papa Pio X que não é muito conhecido, essa atenção ao que será chamado de direitos humanos, e enfatiza que a evangelização não pode ocorrer sem a passagem de uma condição menos humana para uma mais humana. Além disso, o Papa deu poder aos bispos para agirem contra essa violência. O texto de Pio X ainda é conhecido no Brasil hoje? A encíclica não foi muito conhecida no Brasil: foi escrita em latim, as notícias circulavam lentamente… Mas aqui em Roraima, o bispo da época a publicou e a espalhou por toda a prelazia. Naquela época, os beneditinos enfrentavam os fazendeiros, os grandes proprietários de terras, que desencadearam uma perseguição contra eles também. Nos arquivos, há muitos testemunhos desses ataques dos fazendeiros contra os missionários. Portanto, podemos dizer que, no início, a carta não era muito conhecida, mas foi “vivida” pelos missionários da época. Há continuidade entre a encíclica de São Pio X e o magistério do Papa Francisco? É interessante que os beneditinos propuseram a criação de um território indígena em 1912. A partir daí, pode-se ver uma certa continuidade. Podemos falar não apenas de continuidade, mas também de algo que foi realizado com relação às indicações dadas pelo Papa. Pode-se também falar hoje de uma “situação de choro” com relação aos povos indígenas? Quais são os maiores desafios ainda em aberto? Não há dúvida de que essa encíclica é extremamente atual. Há apenas uma semana, a Suprema Corte do Brasil decidiu contra o “Marco Temporal”, a lei que buscava arrancar seus territórios dos povos indígenas. O documento de Pio X fala do direito dos povos indígenas de possuírem suas próprias terras, e até hoje isso ainda está sendo questionado. Portanto, está claro para mim que a encíclica é muito, muito oportuna. Durante o Sínodo da Amazônia, ressoou o direito dos povos indígenas à sua própria terra, à sua própria cultura. Naquela ocasião, foi…
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“Santos, não mundanos”, o último presente de Francisco aos padres e madres sinodais

Publicado pelas Edições Vaticanas em 6 de outubro, com três textos, dois do Cardeal Jorge Mario Bergoglio e um do Papa Francisco, o Santo Padre deu este presente, presumimos que na esperança de que o leiam e que os ajude no processo de discernimento, aos padres e madres sinodais que, de 4 a 29 de outubro, estão participando da primeira sessão da Assembleia Sinodal do Sínodo da Sinodalidade. O título do livro é “Santos, não mundanos. Deus nos salva da corrupção interior“. Mundanismo espiritual Uma publicação que começa dizendo que “a fé cristã é uma luta, uma batalha interior para vencer a tentação de nos fecharmos em nós mesmos e nos deixarmos habitar pelo amor de um Pai que deseja a nossa felicidade”, referindo-se ao mundanismo espiritual, que ele define como “paganismo disfarçado com vestes eclesiásticas”. O Santo Padre pede que a Igreja esteja “suficientemente próxima da cruz de seu Senhor” como fonte de fecundidade e uma forma de santidade, que envolve “o desejo incessante e inabalável de permanecer unida à cruz de Jesus”. “Corrupção e pecado. Somente diante de Deus ou de uma criança devemos nos ajoelhar” é o primeiro texto, denunciando a corrupção como “uma das realidades habituais da vida”. Para enfrentá-la, ele propõe “sacudir nossas almas com o poder profético do Evangelho, que nos coloca na verdade das coisas, removendo a folhagem da fraqueza humana, para a corrupção”. O cardeal Bergoglio convidou todos a dizerem sem medo para si mesmos: “Pecador, sim, corrupto, não! O texto analisa o significado do pecado na vida humana, bem como a corrupção. Com esse texto, ele queria ajudar a “compreender o perigo de colapso pessoal e social que a corrupção acarreta; e também nos ajudar a ser vigilantes, porque um estado diário de cumplicidade com o pecado pode nos levar à corrupção”. Análise da corrupção O texto analisa a corrupção do ponto de vista do Método, procurando evitar que a corrupção se torne um lugar comum de referência, ajudando-nos a entrar na estrutura interna do estado de corrupção, a descrever o modo de proceder de uma pessoa, de um coração corrupto (diferente do de um pecador) e a passar por algumas das formas de corrupção com as quais Jesus teve de lidar em seu tempo, analisando a corrupção entre os religiosos.  Ele insiste em não confundir pecado com corrupção, afirmando que “o pecado é perdoado; a corrupção, porém, não pode ser perdoada”. Por isso, falando sobre o fingimento, ele ressalta que “a corrupção, em vez de ser perdoada, deve ser curada”, porque é “uma daquelas doenças vergonhosas que se tenta esconder, e se esconde até que não possa mais ser escondida”. Uma realidade que leva à comparação, buscando “encobrir sua incoerência, para justificar sua própria atitude”, uma comparação distorcida. Uma comparação que leva ao julgamento, querendo parecer equilibrado, e do julgamento à falta de vergonha, que leva a se voltar contra si mesmo, a se contentar com uma mentira, que leva a uma modesta falta de vergonha. Evitando o triunfalismo O texto reflete sobre o triunfalismo, que ele define como um terreno ideal para atitudes corruptas que fazem com que as pessoas se sintam vencedoras e integrem situações estáveis de degeneração em sua personalidade, levando-as a perder a esperança. Uma corrupção que leva a “reler os mistérios eclesiais com parâmetros de redenções políticas ou mesmo de realidades político-culturais das pessoas, mesmo que sejam boas, as tornará cúmplices em sua escolha de estilo”. Enquanto na tentação do pecado a tentação cresce, se espalha e se justifica, a corrupção se consolida, convoca e estabelece a doutrina, afirma o texto. Voltando ao tempo de Jesus, aparecem histórias que são uma amostra da corrupção, analisando as atitudes de diferentes grupos e pessoas. A partir daí, ele chega à conclusão de que “a corrupção não é um ato, mas um estado, um estado pessoal e social, no qual a pessoa se acostuma a viver”. Uma corrupção presente naqueles que são religiosos, porque “a alma se acostuma com o mau cheiro da corrupção”. “Resistir ao formalismo hipócrita”. Finalmente, o livro inclui a Carta aos sacerdotes da diocese de Roma, intitulada “Resistir ao formalismo hipócrita“, escrita em 5 de agosto, onde afirma a necessidade de “trocar olhares cheios de cuidado e compaixão, aprendendo de Jesus que olhava assim para os apóstolos, sem exigir deles um roteiro ditado pelo critério da eficiência, mas oferecendo atenção e descanso”. Aos sacerdotes, Francisco diz que se sente “no caminho com vocês“, mostrando sua proximidade com eles em todas as circunstâncias, questionando-os: “neste nosso tempo, o que o Senhor pede de nós? Onde nos guia o Espírito que nos uniu e nos enviou como apóstolos do Evangelho?”, chamando-os a refletir sobre o mundanismo espiritual e mostrando seu perigo, porque “reduz a espiritualidade a uma aparência”, a um formalismo hipócrita criticado por Jesus em certas autoridades religiosas da época, a uma tentação. Ele também relaciona o mundanismo espiritual ao clericalismo, querendo se mostrar como “superior, privilegiado, colocado ‘no alto’ e, portanto, acima do resto do povo santo de Deus”. Diante disso, ele mostra a necessidade de “olhar para Jesus, para a compaixão com que ele vê nossa humanidade ferida, para a gratuidade com que ele ofereceu sua vida por nós na cruz”. Ele pede que permaneçam vigilantes em relação ao clericalismo e que rezemos uns pelos outros, para que Deus “nos ajude a não cair, tanto em nossa vida pessoal quanto em nossa ação pastoral, nessa aparência religiosa cheia de tantas coisas, mas vazia de Deus, para não sermos funcionários do sagrado, mas anunciadores apaixonados do Evangelho”. Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1

Formação nos seminários: Primeiro grande consenso do Sínodo da Sinodalidade

O Sínodo sobre a Sinodalidade realizou nesta sexta-feira, 6 de outubro, com a presença do Papa Francisco, sua primeira Congregação Geral. Bem é verdade que a abertura, na tarde da última quarta-feira, adotou essa modalidade, mas hoje foi o primeiro dia em que os membros do Sínodo partilharam as reflexões partilhadas nos círculos menores, nas comunidades para o discernimento, e o primeiro grande tema de consenso é a formação nos seminários. Um sentimento geral entre a grande maioria dos presentes na primeira sessão da Assembleia Sinodal do Sínodo da Sinodalidade, que está sendo realizada no Vaticano de 04 a 29 de outubro. Grande preocupação do Papa Francisco A formação nos seminários é uma das grandes preocupações do Papa Francisco. Em novembro de 2022, em um encontro com os participantes do Curso para Reitores e Formadores de Seminários da América Latina, insistindo em colocá-la “no centro da evangelização”, que ela “tem um caráter eminentemente comunitário”, que as casas de formação sejam “verdadeiras comunidades cristãs” e que seja “uma formação de qualidade”. O Instrumentum laboris, base dos trabalhos dos membros da Assembleia Sinodal, afirma que “a promoção de uma cultura de sinodalidade implica a renovação do atual currículo dos seminários”, ressaltando que “a formação para uma espiritualidade sinodal está no centro da renovação da Igreja”. Isso implica, afirma o texto a necessidade de “uma renovação dos programas dos seminários, para que sejam mais sinodais e estejam mais em contato com todo o Povo de Deus”. Uma questão que aparece nas perguntas recolhidas no Instrumento de Trabalho, questionando sobre as diretrizes para uma reforma dos currículos de formação, buscando colocar a formação em relação mais estreita com os processos pastorais. O Instrumentum laboris pergunta pelas linhas a serem assumidas em vista dos seminaristas “crescer num estilo de exercício da autoridade próprio de uma Igreja sinodal”. Seminaristas com vida comunitária e no meio dos pobres São elementos que apareceram no debate das comunidades para o discernimento espiritual, insistindo na participação dos seminaristas na vida comunitária e em eles terem experiências com os mais pobres. Se busca que os futuros presbíteros sejam animadores da vida eclesial desde sua vivência, vida missionária e testemunho de vida sinodal, ressaltando o necessário desenvolvimento de uma mística da sinodalidade, de uma Igreja em saída, de uma formação arraigada nas realidades das quais procedem os seminaristas. O ponto de chegada deve ser que no final do processo formativo, os novos presbíteros sejam multiplicadores de uma eclesialidade que tem como fundamento a sinodalidade e assim fomentar processos eclesiais de comunhão, participação e missão em todos os membros do povo de Deus, superando assim um dos grandes pecados da Igreja segundo Francisco: o clericalismo, algo que atrapalha a sinodalidade. Diversidade de temáticas A primeira sessão da Assembleia Sinodal, onde é considerado de grande importância os momentos de silêncio após as intervenções, está acontecendo em clima de fraternidade, em uma atmosfera alegre, segundo foi partilhado pelo Dicastério para a Comunicação do Vaticano no briefing com os jornalistas acreditados, sendo vivenciado como uma oportunidade para partilhar experiências de diferentes contextos. Os 18 círculos menores que partilharam até o momento, dos 35 em que está dividida a Assembleia, colocaram outros temas: importância da participação das mulheres na Igreja, o reconhecimento do papel dos jovens, a escuta, o silêncio e a oração como um momento de discernimento. Outros temas que apareceram na Congregação Geral foi o papel dos ministérios ordenados em uma Igreja sinodal, a importância da Liturgia Dominical, de estar com os pobres e ser uma Igreja pobre, uma Igreja acolhedora, sobretudo com os migrantes, onde o bispo tem que assumir um papel de acompanhamento. O desafio é o surgimento de uma nova Igreja, que seja família, onde o poder seja transformado em serviço, onde seja assumido que a sinodalidade faz parte do DNA da Igreja. Para isso, se faz necessário rever a estrutura da Igreja, a estrutura das cúrias, o Direito Canônico, a pregação, o que mudar para se tornar uma Igreja acolhedora. Uma Igreja que deve se purificar de certos costumes que não estão em conformidade com o Evangelho. Uma Igreja desafiada a estar presente no mundo virtual, nas redes sociais, espaço de vivência habitual de muitas pessoas. Uma Igreja Samaritana, não é dos perfeitos, que ama todos os seus filhos e especialmente aqueles que vivem à margem da sociedade. Uma Igreja extrovertida, onde os pastores são paternos e maternos ao mesmo tempo, a fim de alcançar os corações de todos. Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1

Cardeal Steiner novo presidente do Cimi: “Grande testemunho de como evangelizar os nossos povos através da presença”

O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) realizou recentemente sua XXV Assembleia Geral, com o tema “Direitos Originários, Territórios Livres, Justiça e Paz como fontes do Bem Viver e Conviver”, onde foi eleita a nova presidência do Cimi, que vai conduzir a entidade pelos próximos quatro anos. Nova presidência O novo presidente do Cimi é o cardeal Leonardo Ulrich Steiner, arcebispo de Manaus e presidente do Regional Norte1 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Junto com ele, fazem parte da diretoria, Alcilene Bezerra da Silva, missionária do Regional Nordeste, que será a vice-presidente e Luis Ventura Fernández, novo secretário executivo. Dom Leonardo Steiner sucede a Dom Roque Paloschi, arcebispo de Porto Velho, que assumiu a presidência nos últimos oito anos, que destacou o trabalho do Cimi como “um serviço de amor aos pobres, da terra”. Ele animou a nova presidência, insistindo no longo trabalho pela frente que a Igreja do Brasil tem como missão junto aos povos originários, um caminho marcado pelas conquistas, lutas e retrocessos. Um organismo para ouvir e encaminhar as questões O novo presidente do Cimi, um dos membros da primeira etapa da Assembleia Sinodal do Sínodo sobre a Sinodalidade, que está sendo realizado no Vaticano de 4 a 29 de outubro de 2023, em representação do episcopado brasileiro, destacou que “o Cimi é um organismo da CNBB, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, fundado há mais de 50 anos tem prestado um grandíssimo serviço aos povos indígenas, tem ouvido suas causas, tem sido uma presença ativa através dos missionários e missionárias em muitas aldeias, tem conseguido reunir diversas comunidades indígenas, ouvi-las e encaminhar as questões, questões que dizem respeito à cultura, aos direitos, à questão da terra, a questão do Marco Temporal”. Segundo o cardeal Steiner, “o Cimi não presta só um serviço aos povos indígenas, presta um grande testemunho de como viver o Evangelho, de como evangelizar os nossos povos através da presença, uma presença de esperança, uma presença de consolo, uma presença de misericórdia”. Lideranças indígenas na XXV Assembleia Geral do Cimi. Foto: Hellen Loures/Cimi Continuarmos a servir “Conheci o Cimi, comecei a trabalhar junto do Cimi, a servir junto do Cimi quando bispo de São Félix do Araguaia. Como bispo de São Felix do Araguaia, junto com dom Pedro Casaldáliga conseguimos encaminhar diversas questões, que diziam respeito aos povos indígenas na prelazia de São Felix do Araguaia como a Terra de Marãiwatsédé, do Povo Xavante, e também a Terra do Urubu Branco, do Povo Tapirapé”, destacou o cardeal, lembrando da figura de um dos fundadores do Cimi. Em suas palavras, o novo presidente do Cimi, agradeceu “a confiança dos missionários e missionárias e dos indígenas que votaram na minha pessoa”, um agradecimento que também faz pela confiança na vice-presidente e no secretário. Dom Leonardo Steiner enfatizou que “vamos procurar continuar a servir, vamos procurar continuar a acompanhar os nossos povos indígenas, assim como foi feito pelas diversas presidências do Cimi através desses 50 anos”. Ele pediu que “Deus nos ajude a continuarmos a servir, Deus nos ajude a continuarmos a perceber onde estão as maiores dificuldades para podermos apoiar”. Presença bem faceja, misericordiosa e esperançada Finalmente, o novo presidente do Cimi ressaltou que “hoje graças a Deus os povos indígenas estão bastante organizados e nós queremos também ajudar a essas organizações a serem cada vez mais uma voz para que a voz dos povos indígenas possa ser ouvida na sociedade brasileira”. Invocando novamente a benção de Deus, o cardeal pediu “que nós possamos junto com os missionários e as missionárias ser essa presença bem faceja, misericordiosa e esperançada junto às comunidades indígenas, junto aos povos indígenas”. A assembleia do Cimi, segundo recolhe o Documento Final, definiu as prioridades para o biênio 2024 e 2025: Povos indígenas em contexto urbano e políticas de identidade; Terra, território e direito humano à água; Defesa da Constituição Federal de 1988 e da natureza como sujeito de direito. Para isso o Cimi vai incidir na formação, na promoção de encontros no campo da espiritualidade, das políticas públicas, de questões sociais, culturais e relacionadas com o mundo urbano. Igualmente a XXV Assembleia do Cimi manifestou seus esforços no apoio da demarcação das terras e lutas cotidianas em busca da consolidação dos direitos fundamentais. Um compromisso “profético, militante e missionário em defesa da vida em plenitude”. Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1

Usar a palavra com liberdade, um passo decisivo em uma Igreja sinodal

No Sínodo das mesas redondas é interessante ver as dinâmicas que querem ser introduzidas na Igreja, um modo de ser Igreja no qual Francisco tem muito a dizer, e ele o diz. Nesse sentido, recordando uma anedota que lhe aconteceu, ele disse que, em um Sínodo onde era relator, experimentou tensões com o cardeal secretário, que proibiu que certos temas fossem introduzidos na votação, o que levou o então cardeal Bergoglio a se queixar da falta de sinodalidade e do fato de que todos não podiam se expressar livremente. A Palavra como fruto da liberdade Isso nos leva a refletir sobre uma questão fundamental, especialmente em uma Igreja sinodal, na verdade, em todas as formas de ser Igreja, o que significa a palavra como fruto da liberdade. Uma Igreja que respeita a palavra de cada membro. É com base nessas pequenas intuições que se cria um espírito de comunhão e se constrói um modo de ser Igreja, algo que não é fácil de assumir nestes tempos, mas sem o qual é difícil prever um futuro promissor para a vivência da catolicidade. Somente dessa forma, com a possibilidade de usar a palavra livremente, pode-se progredir em uma sinodalidade na Igreja que, nas palavras do Santo Padre em seu discurso de abertura, “ainda não está madura“. Até certo ponto, em alguns órgãos eclesiais, perpetua-se o hábito de não permitir que todos se expressem livremente, algo que Francisco insiste em deixar para trás, e uma das razões pelas quais ele convocou este Sínodo sobre a sinodalidade. Tornar o Espírito presente em círculos menores Na medida em que o Espírito se fizer presente nessas mesas redondas, nos 35 círculos menores em que se organiza a sala sinodal, as vozes daqueles que se sentem rejeitados pela própria Igreja ou pelo mundo, estando ou não nessa sala, se sentirão acolhidas, pois não podemos nos esquecer de que este é um Sínodo da Igreja, com representantes das Igrejas do mundo inteiro, e ninguém deve ser a voz de si mesmo, mas de uma Igreja que já percorreu um caminho no processo de escuta e nas diferentes etapas que se realizaram. Uma Igreja sinodal deve ser uma Igreja com um olhar que abençoa, buscando desejar e construir o bem. E essa construção do bem deve ser um requisito para aqueles que estão sentados nas mesas redondas em que a sala sinodal está organizada. Aqueles a quem foi confiado, por meio do discernimento comunitário, encontrar novas maneiras de tornar uma Igreja sinodal uma realidade, não podem ser pessoas que colocam paus nas rodas. Apoiar as reformas do Papa Francisco, sempre com a liberdade de discuti-las na busca da construção do bem, não é negociável para aqueles que são membros do Sínodo. A metodologia do Sínodo A Igreja sinodal sonhada por Francisco é uma Igreja que acolhe os pequenos, os simples, uma Igreja que é o abraço de Deus, especialmente para tantos homens e mulheres que estão sobrecarregados, cansados, que se sentem perdoados por sua abertura à ação do Espírito. Há muitos dias pela frente para se olharem nos olhos e, assim, abrirem seus corações a pessoas diferentes, muitas delas estranhas umas às outras, mas que ganharão confiança para construir juntas, com uma metodologia que busca a Igreja para decidir em um espírito de comunhão, como Paolo Ruffini, prefeito do Dicastério para a Comunicação, insistiu no briefing com os jornalistas realizado na Sala Stampa em 5 de outubro. Ruffini insistiu na confidencialidade e explicou a metodologia de trabalho até o final da primeira fase da Assembleia Sinodal. Um elemento fundamental é a conversa no Espírito, onde todos falam e escutam, uma possibilidade que também existirá nas congregações gerais, insistindo na liberdade com a qual Francisco quer que a Assembleia sinodal seja vivida, a fim de avançar no caminho da comunhão, um dos grandes desafios deste Sínodo sobre a sinodalidade, a partir de uma experiência espiritual. Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1

Laudate Deum: “Não podemos deixar aos nossos filhos apenas bens, devemos deixar-lhes princípios, esforços para mudar o mundo”.

Refletir sobre a Laudato Deum a partir de diferentes testemunhos, em um ambiente privilegiado, os Jardins do Vaticano, foi o objetivo da coletiva de imprensa organizada um dia após o lançamento dessa exortação apostólica que o próprio pontífice apresenta como uma segunda parte da Laudato Si’, escrita há oito anos. Enfrentando a mudança climática Analisando diferentes aspectos do texto de Francisco, tanto presencial quanto virtualmente, foi aprofundado um texto que mostra as consequências da mudança climática, algo que impacta especialmente os mais desfavorecidos, segundo Giorgio Leonardo Renato Parisi, um dos ganhadores do Prêmio Nobel de Física de 2021. Em sua reflexão, ele pediu que as mudanças climáticas sejam enfrentadas, reconhecendo que isso “exige um enorme esforço de todos“, destacando a necessidade de maiores esforços por parte dos países que mais poluem, pedindo acordos internacionais estáveis e verificáveis, mas também que uma nova cultura seja criada nas famílias, com o objetivo de gerar transformações. O físico italiano enfatizou a necessidade de levar recursos aos países menos desenvolvidos, dando como exemplo os painéis fotovoltaicos na África, onde não há recursos para isso, o que exige um pacto mundial global. Ele também pediu uma melhoria na educação, especialmente para as mulheres, nesses países. Por fim, ele destacou algumas das ideias do texto: falta de ação suficiente, superação de conflitos internacionais, necessidade de humanidade solidária e evitar pontos de ruptura. Uma conexão que vem de Deus Uma conexão que vem de Deus, como foi testemunhado da Índia, algo que deve nos levar a superar o orgulho destrutivo, a descobrir a conexão com um universo sagrado. A partir da experiência do país, foi feito um apelo para que se desenvolva um tipo diferente de economia, pois a Índia é capaz de produzir alimentos mais saudáveis a partir da proteção da terra, o que deve levar ao fim das práticas prejudiciais ao planeta, gerando soluções criativas, o que nos leva, com o Papa Francisco, a entender que o paradigma tecnocrático não é a solução, o que exige cuidar da Terra e do próximo como um caminho para o futuro. A Laudate Deum nos ajuda a descobrir o momento dramático em que vivemos, nas palavras de Carlo Petrini, que denunciou a falta de medidas decisivas por parte dos governos nos últimos anos, com “governos ineficazes e incapazes, que desenvolveram condições que levaram o meio ambiente a uma situação irreversível”. Isso exige ações para conter o desastre ambiental diante de uma situação difícil que não é fácil de administrar em nível institucional, o que representa uma situação extremamente crítica. Ele também pediu a condenação do negacionismo, que “está se tornando uma barreira contra a luta contra as mudanças climáticas”. Isso exige um impulso da sociedade civil que possa promover um clima diferente, daí a importância dos movimentos que nascem de baixo para cima, considerando o documento pontifício como “uma das últimas oportunidades para mudar o curso e tomar consciência de que não podemos olhar para o outro lado”. Agir agora A importância de nossa responsabilidade, de que temos que agir agora, foi abordada por Jonathan Safran Foer, que apontou a necessidade de despertar o mundo, de abrir os olhos para descobrir o que está acontecendo, dando como exemplo o que aconteceu com os judeus na Polônia ocupada pelos nazistas e a incapacidade de acreditar na verdade. Ele disse que “sabemos que a situação vai piorar, mas não nos sentimos envolvidos, estamos diante de uma história que não somos capazes de aceitar“. Daí a necessidade de enfrentar as situações, afirmando que aceitar a verdade não é fácil. De acordo com o escritor americano, “sabemos que estamos colocando em risco as gerações futuras, mas não estamos dispostos a mudar nosso comportamento“, afirmando que o que fazemos não é suficiente, mas não queremos considerar ações diferentes. Insistindo em mudanças no nível político, com mudanças estruturais, mudanças legais, aprimoramento de fontes renováveis, ele insistiu que temos que mudar pessoalmente, para ajudar as pessoas a serem mais poderosas na tomada de decisões concretas. Isso se deve ao fato de que “as revoluções coletivas nascem do indivíduo, a soma de diferentes decisões pode ajudar a mudar o mundo”. Ele também se referiu ao chamado alimento ético, a não ser catastróficos, a compromissos para evitar uma catástrofe e garantir o futuro, enfatizando que “não podemos deixar para nossos filhos apenas bens, temos que deixar princípios, esforços para mudar o mundo“. Líderes políticos a serviço dos combustíveis fósseis Os jovens, entre os quais se encontram hoje os mais comprometidos com o cuidado da casa comum, que é uma razão de esperança, testemunharam como estão se posicionando sobre as mudanças climáticas e o cuidado da casa comum. Luisa-Marie Neubauer, uma jovem ativista climática da Alemanha, testemunhou seu compromisso, juntamente com milhões de jovens nos Fridays for Futuro, com base no que vivenciou em sua cidade natal, Hamburgo. A jovem alemã disse estar assustada com “a maneira como nossos líderes respondem à crise”, empenhados em “atender aos interesses dos combustíveis fósseis e evitar mudanças reais”, um caminho que “coloca em risco nossa segurança planetária”. A jovem denunciou que os governos “em vez de responsabilizar aqueles que continuam a queimar combustíveis fósseis, os governos de todo o mundo começaram a criminalizar aqueles que defendem a terra e a vida”, dando exemplos disso. A partir daí, criticou a postura do Norte global, “uma crise de cultura, de uma humanidade que não conseguiu estabelecer uma relação profunda com nossos recursos naturais“. A isso se soma “a crise de esperança”, que a levou a se perguntar o que lhe dá esperança, destacando os apelos feitos na Laudato Deum nesse sentido, pedindo a todos que sejamos ativistas, nos moldes propostos pelo Papa, “uma revolução coletiva, cultural e espiritual”, na qual a Igreja Católica “se torne uma verdadeira aliada”. Destruímos nossas condições de existência Benoit Holgand, um católico praticante de 25 anos, membro do movimento “Lutte et Contemplation”, disse estar “ciente do perigo climático que estamos enfrentando”, demonstrando sua angústia diante de uma humanidade que “está destruindo suas próprias condições de existência”. Em…
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Francisco abre o “Sínodo das Mesas Redondas” para ouvir o Espírito Santo

Homens e mulheres em uma mesa redonda para discernir, à luz do Espírito Santo, por meio da escuta e do diálogo, os caminhos para uma Igreja mais sinodal, uma Igreja de comunhão, participação e missão, a Igreja com a qual Francisco sonha para o século XXI. Todos nós sabemos o que significa sentar-se ao redor de uma mesa redonda, onde ninguém está à frente, onde não há lugar de destaque, onde todos e todas, as mulheres podem falar e decidir neste Sínodo, ter sua vez e sua voz respeitada. É impressionante ver a Sala Paulo VI repleta dessas mesas redondas, expressão de uma Igreja mais circular e menos piramidal, uma Igreja que responde melhor ao paradigma de comunidade que nos é apresentado nos Atos dos Apóstolos. O desafio é que isso seja levado aos muitos lugares da Igreja universal de onde vieram os 464 homens e mulheres presentes na sala sinodal. Mas, apesar das dificuldades, é algo que valerá a pena, porque ajudará a reconstruir a Igreja, esse pedido que Francisco de Assis recebeu um dia e que Francisco de Roma recebeu há pouco mais de 10 anos. O Papa tem tomado medidas ao longo de seu pontificado para criar essa Igreja que hoje está representada na Aula Paulo VI. Se há uma coisa em que ele é mestre, é em como ele mede os tempos, e não há dúvida de que este é o tempo certo, o tempo da Salvação, o tempo de Deus para tornar o Evangelho carne neste momento da história. Na medida em que se permitir que o Espírito Santo seja o verdadeiro, o grande protagonista deste Sínodo, serão dados passos fundamentais e irreversíveis neste modo de ser Igreja, tão antigo e tão novo. Não desviemos o foco, que ninguém queira assumir um protagonismo que não lhe pertence, é o tempo do Espírito de Deus, que quer soprar, à sua maneira, para continuar construindo, como vem fazendo desde o dia de Pentecostes, há quase 2.000 anos. Aqueles discípulos entenderam suas línguas e as levaram até os confins da terra. Ajudemos esses homens e mulheres sentados ao redor das mesas redondas a discernir, por meio da oração, da escuta e do diálogo, o caminho a seguir que a Igreja precisa tanto encontrar hoje. Este é o tempo do Sínodo, de caminharmos juntos, não deixemos que ninguém tente colocar obstáculos em nosso caminho, empurremos juntos para que possamos ir mais longe, movidos pelos sentimentos que nascem de Deus e que nos fazem descobrir a vida em sua plenitude. Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1